O texto a seguir é um estudo que estabelece princípios sobre como interpretar a bíblia do livro Conhecendo a Bíblia – capítulo quatro - do irmão Witness Lee. É um estudo precioso para auxilar-nos a compreensão correta da bíblia. Kleydson Feio
PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO DA BÍBLIA
Neste capítulo, precisamos ver alguns dos princípios de interpretação da Bíblia. Se quisermos estudar a Bíblia, temos de entendê-la. Para entendermos a Bíblia, precisamos interpretá-la. Sem interpretação nem explicação, naturalmente não teremos como entender a Bíblia. Sabemos que todas as coisas têm seus princípios próprios. Quanto mais valorizado e importante for um assunto, mais rigorosos serão os seus princípios e leis governantes. Se determinado assunto não tem qualquer significado ou importância, e pode ser conduzido de qualquer maneira, não há que se falar em leis, princípios ou regras. Mas, se um assunto é respeitável e ocupa um lugar significativo e de destaque, se é algo grandioso e nobre, certamente existirão princípios e leis que governam esse assunto; não se pode encará-lo levianamente.
A Bíblia é um item extremamente grandioso no universo. Além do nosso Senhor e Deus da glória, creio que o maior item no universo é a Bíblia que temos diante dos nossos olhos e em nossas mãos. Uma vez que a Bíblia é tão importante, precisamos da interpretação adequada, para que possamos estudá-la e entendê-la. Essa interpretação tem de ser regida por regras, leis e princípios definidos. Não podemos interpretá-la ao nosso bel-prazer. Agora que vimos como a Bíblia foi escrita, como ela foi traduzida para diversas línguas e posta em nossas mãos como um livro tão disponível, precisamos descobrir os princípios e leis governantes para a sua interpretação e estudo. Isso não apenas nos ajudará a entender a Bíblia, como também nos ajudará a evitar muitos erros.
Todas as regras são um tipo de proteção. Se um trem não tiver trilhos para correr, ele não apenas será incapaz de mover-se suavemente, como também não terá proteção. Quando há trilhos, o trem move-se sem trancos e tem uma proteção adequada. O mesmo ocorre com o estudo da Bíblia. Se alguém estuda e expõe a Bíblia de maneira cega e descuidada, o resultado será inconcebível e até mesmo perigoso. Nossos pensamentos freqüentemente não têm limites. É muito perigoso a pessoa julgar segundo o que ela pensa e interpretar conforme concebe por meio dos sentidos. Se queremos estudar adequadamente a Bíblia e entendê-la com precisão, é necessária uma interpretação restritiva. Se quisermos uma exposição restritiva da Bíblia, precisamos encontrar os princípios e leis de interpretação da Bíblia. Mostraremos, aqui, dez desses princípios.
I. O MAIS LITERAL POSSÍVEL
O primeiro princípio de interpretar e entender a Bíblia é: o mais literal possível. Temos de apegar-nos firmemente ao fato de que quando Deus inspirou homens para escrever a Bíblia, Ele usou palavras que são totalmente compreensíveis ao homem. Quando tentamos entender a Bíblia hoje, temos de entender o pensamento de Deus, estrita e precisamente segundo a letra das palavras. Não devemos pensar que, uma vez que a Bíblia foi inspirada por Deus, ela sempre transcende a linguagem humana, e, portanto, está aberta para interpretação espiritual. Essa é uma tese perigosa. Devemos interpretar a Bíblia segundo o significado literal das palavras. Não importa quão difícil ou descabida uma interpretação literal possa nos parecer, temos de aderir estritamente ao significado literal.
Mencionemos alguns exemplos. Um exemplo óbvio é a profecia do Antigo Testamento, em Isaías, a respeito do Senhor Jesus nascer de uma virgem. Hoje, o Senhor Jesus já nasceu de uma virgem. Portanto, para nós não é surpresa quando lemos ou ouvimos essa palavra. Mas, na época de Isaías, quando os homens liam o que ele escrevera sobre uma virgem dar à luz um filho e chamá-lo de Emanuel, não teriam eles tido dificuldades em sua mente? Uma pessoa certamente teria dificuldade em entender como uma virgem poderia estar grávida. Alguns poderiam ter-se voltado para uma interpretação espiritual, sugerindo que a virgem pudesse significar algo mais que uma virgem de verdade. Mas quando essa profecia foi cumprida, ela foi cumprida literalmente. A virgem referia-se a uma virgem de verdade. Também, o livro de Zacarias, no Antigo Testamento, profetizou que o Senhor Jesus haveria de entrar pela última vez em Jerusalém montado em um jumentinho. Quando alguém lia isso, naquela época, poderia achar difícil entender, porque, para eles, esse a quem os outros proclamariam “Hosana”, o Rei digno de louvor, o mais estimado de Israel, nunca poderia entrar em Jerusalém montado em um jumentinho. As pessoas achariam ilógico montar um jumentinho. Por essa razão, eles interpretariam espiritualmente essa profecia, de maneira que significasse algo diferente. Entretanto, quando a profecia foi cumprida, ela foi cumprida literalmente em todos os aspectos. A palavra era jumentinho, e de fato foi um jumentinho. Quando lemos a Bíblia, por um lado, temos de receber inspirações espirituais, mas, por outro lado, não devemos alterar o significado literal a fim de combinar com uma interpretação espiritual. Somente quando uma interpretação literal de uma profecia ou parábola leva a situações absurdas ou impropriedades é que se pode interpretá-las espiritualmente. Mas são poucos esses casos na Bíblia. Deve-se considerar cuidadosamente se uma passagem deve ser interpretada literal ou espiritualmente. Há uma grande diferença nisso. Ouvi falar que alguns interpretam os gafanhotos em Apocalipse como sendo os aviões de
hoje, e a praga proveniente dos céus como sendo as bombas lançadas pelos aviões. Isso é ridículo. Devemos ser cuidadosos para não interpretar tão livremente a Bíblia. Se alguém quiser encontrar exemplos de interpretações esquisitas e irracionais, leia “Os Sinais dos Tempos”, publicado pelos adventistas do sétimo dia. Neste livro pode-se encontrar as interpretações mais irrestritas e absurdas. Não devemos interpretar a Bíblia dessa maneira. Devemos apegar-nos aos princípios e aderir, o máximo possível, ao significado literal. Somente quando a interpretação literal de algumas palavras, em algumas visões, profecias e parábolas torna-se muito absurda e tola é que se pode interpretá-las espiritualmente.
II. NÃO INTERPRETAR LITERAL E ESPIRITUALMENTE A MESMA SENTENÇA, VERSÍCULO OU SEÇÃO
Não podemos interpretar uma sentença, versículo ou seção da Bíblia espiritualmente em sua primeira parte e literalmente a segunda parte. Tampouco devemos fazê-lo da maneira inversa. Se uma passagem deve ser interpretada espiritualmente, deve sê-lo por completo. Igualmente, se uma passagem deve ser interpretada literalmente, deve sêlo por completo. Por exemplo: o Senhor Jesus disse em João 3 que, se a pessoa não nascer da água e do Espírito, ela não pode entrar no reino de Deus. Muitos expositores da Bíblia têm interpretado espiritualmente a água, nessa passagem, referindo-se à palavra de Deus. Entretanto, na frase seguinte, eles tomam literalmente o Espírito, referindo- se ao Espírito Santo. Esse tipo de interpretação é errado e contraria o princípio de interpretação da Bíblia. Se deve-se interpretar literalmente o Espírito na segunda sentença, deve-se, igualmente, interpretar literalmente a água na primeira sentença, e vice-versa. Como não se pode interpretar espiritualmente o Espírito, tampouco se pode interpretar espiritualmente a água nessa passagem, ela deve ser tomada literalmente.
Em Mateus, capítulo 3, João Batista disse: “Eu vos batizo com água, para arrependimento, mas aquele que vem depois de mim é mais poderoso do que eu (...) Ele vos batizará com o Espírito Santo e com fogo. A sua pá ele a tem na mão, e limpará completamente a sua eira; recolherá o seu trigo no celeiro, mas queimará a palha em fogo inextinguível” (vs. 11-12). Alguns expositores da Bíblia interpretam o fogo, aqui, espiritualmente, como tribulações e provas. Alguns chegam até a interpretar como sendo o Espírito Santo queimando como fogo. Todos esses interpretaram espiritualmente a palavra fogo. Mas, neste versículo, a água mencionada por João é água de verdade, e o Espírito Santo é o Espírito Santo literalmente. Portanto, o fogo na última parte não deve ser interpretado espiritualmente, mas literalmente. Se a palavra fogo deve ser interpretada espiritualmente, então a água também tem de ser interpretada espiritualmente; o que é impossível de ser feito. Este é um princípio importante de interpretação da Bíblia: partes diferentes dentro de uma mesma passagem devem ser interpretadas todas literalmente ou todas espiritualmente; não pode haver mistura.
III. UMA PORÇÃO NÃO É SUFICIENTE PARA REPRESENTAR TODA UMA VERDADE
Ao interpretar a Bíblia, temos de prestar atenção a mais uma coisa: uma porção da Palavra não é suficiente para representar a verdade completa. Em outras palavras:
nenhuma verdade pode ser plenamente expressa em uma única porção da Palavra. Portanto, ao lermos e interpretarmos a Bíblia, devemos prestar atenção às palavras “também está escrito”. Essa palavra é falada pelo Senhor Jesus em Mateus 4:7. Quando o Senhor foi tentado, o diabo citou as palavras do Salmo 91 para o Senhor, nas quais Deus ordenaria aos Seus anjos que O sustentassem, para que Ele não tropeçasse em alguma pedra. O diabo argumentava que Ele podia atirar-se do pináculo do templo e não seria ferido, por haver tal promessa no Antigo Testamento. Quando o Senhor ouviu isso, Ele respondeu imediatamente: “Também está escrito: Nãotentarás o Senhor teu Deus”. Isso nos mostra que não podemos considerar apenas uma porção isolada da Bíblia. Em vez disso, devemos considerar duas, três ou mais porções da Palavra juntas.
Se negligenciarmos o princípio do “também está escrito”, e aplicarmos as palavras da Bíblia de uma maneira isolada, facilmente seremos enganados pelas ciladas do diabo. Se o diabo não consegue impedir a pessoa de seguir a Bíblia, ele a levará a tomar passagens isoladas da Bíblia. E claro que Satanás gostaria que não fizéssemos nada de acordo com a Bíblia. Mas, muitas vezes, ele sabe que isso é impossível. Todos aqueles que amam e temem o Senhor desejam andar de acordo com a Bíblia, O diabo não pode impedir-nos de seguirmos a Bíblia ou de andarmos de acordo com ela. Ele apenas pode usar outras maneiras, uma das quais é fazer com que sigamos a Bíblia de uma maneira isolada. Assim, somos levados ao extremo e esquecemos as palavras que dizem: “também está escrito”. A palavra “também” é uma palavra muito grande. Deveríamos desenhar um círculo ao seu redor. Isso nos mostra que quando seguimos a Bíblia, não devemos fazêlo de maneira isolada. Temos de considerar ambos os lados, até mesmo todos os lados. Nenhuma porção isolada da Bíblia pode representar toda a verdade, da mesma maneira que nenhuma fachada isolada de uma casa pode representar completamente toda a casa. Nós próprios somos assim. Se alguém tira uma foto nossa por trás, não se pode ver nela nenhum buraco na cabeça. Mas se nos tiram uma foto de frente, pode-se ver claramente sete buracos. Nenhum dos lados de um homem isoladamente pode representar a pessoa como um todo. O mesmo pode ser dito a respeito da Bíblia. Nenhuma porção isolada da Bíblia pode representar uma verdade completa, e temos de ser muito equilibrados em tudo. Portanto, temos de lembrar-nos do princípio “também está escrito”.
IV. A TOTALIDADE DOS VERSÍCULOS CONTÉM TODAS AS VERDADES
Um versículo isolado não pode representar uma verdade completa, Entretanto, todos os versículos da Bíblia contêm todas as verdades. Por um lado, para se entender uma verdade não se pode confiar em um único versículo, mas deve-se considerar muitos outros versículos. Por outro lado, ao se definir qualquer verdade, deve-se considerar todos os versículos. Cada versículo na Bíblia contém todas as verdades.
Uma vez, um irmão disse que qualquer versículo da Bíblia exige toda a Bíblia para explicá-lo. Isso é muito correto. Se alguém quer entender Gênesis 1:1, ele tem de entender toda a Bíblia. Por um lado, Gênesis 1:1 não pode conter toda a verdade. Por outro lado, Gênesis 1:1 inclui todas as verdades da Bíblia. Portanto, ao definirmos qualquer verdade, não podemos apoiar-nos unicamente em uma porção da Bíblia. Em vez disso, temos de depender de todas as outras palavras da Bíblia. No mesmo princípio, a explicação de um versículo qualquer não pode ser baseada unicamente em seu próprio contexto, mas deve basear-se em toda a Bíblia. A Segunda Epístola de Pedro 1:20 diz que nenhuma profecia das Escrituras é de particular interpretação (IBBRev.). O significado original desse versículo é que a profecia da Bíblia não deve ser interpretada segundo seu próprio contexto. Isso quer dizer que, para interpretar qualquer profecia, deve-se estudar todas as profecias na Bíblia e tomar decisões baseadas em todas as profecias da Bíblia. Somente assim a interpretação será completa.
Ao se definir uma verdade, às vezes muitos versículos relacionados indicam um determinado significado, mas dois ou três deles não podem ser explicados dessa maneira. Não se pode dizer que, porque somente um ou dois versículos não podem ser explicados dessa maneira, pode-se, portanto, sacrificá-los e basear a exposição na maioria dos versículos. Se a pessoa faz dessa maneira, ela está sacrificando alguns versículos. Não podemos fazer assim. Uma vez que um ou dois versículos não concordem com determinada interpretação, temos de abandonar essa interpretação.
V. NÃO SACRIFICAR NENHUMA PORÇÃO DA PALAVRA
Devemos respeitar todas as porções da Bíblia. Somente quando uma interpretação harmoniza-se com toda a Bíblia é que essa interpretação pode ser considerada confiável. Qualquer versículo que proíba certa interpretação da verdade não deve ser sacrificado. Em vez disso, essa determinada interpretação é que deve ser abandonada, e temos de esperar mais revelação da parte de Deus. Se estudarmos a Bíblia dessa maneira, não cairemos facilmente em erro.
VI. TODAS AS EXPRESSÕES APOSITIVAS SÃO IGUAIS
Há muitas expressões na Bíblia que estão em aposição a outras. Todas essas expressões apositivas são equivalentes e não diferentes. Por exemplo: Mateus 5 fala de nove bem-aventuranças. Ali diz: “Bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles é o reino dos céus”, e “Bem-aventurados os limpos de coração, porque verão a Deus”. Essas são expressões casadas, onde a primeira expressão combina com a segunda. Neste caso, em cada bem-aventurança, há, primeiramente, a condição para a bênção e, então, a própria bênção. Todas as expressões casadas são equivalentes. Se a primeira parte de uma expressão especifica uma condição, então todas as primeiras partes dessas expressões casadas também especificam condições. Se a segunda parte de uma expressão especifica uma bênção, então a segunda parte de todas essas expressões também especificarão uma bênção. Este é outro princípio ou regra. N. do T.: Aposição = emprego de um substantivo, ou locução substantiva, como aposto. Aposto = nome, ou expressão equivalente, que exerce a mesma função sintática de outro elemento a que se refere.
VII. NÃO SER RESTRINGIDO PELO BACKGROUND NEM IGNORÁ-LO
Ao interpretar a Bíblia, não se deve ser restringido pelo background, tampouco ignorá-lo. Por exemplo: no sermão que o Senhor fez no monte, são ditas muitas palavras de background judaico. O Senhor diz: “Se, pois, ao trazeres ao altar a tua oferta, ali te lembrares de que teu irmão tem alguma cousa contra ti” (Mt 5:23). Essa oferta no altar é totalmente fundamentada no background judaico. Se quiser entender o significado original dessa palavra, você não pode desconsiderar o background daquela época. Os judeus apresentavam suas ofertas no altar com o propósito de aproximarem-se de Deus e terem comunhão com Ele. Se você tomar esse princípio, perceberá que as palavras do Senhor dizem respeito a um homem oferecendo algo diante de Deus e tendo comunhão com Ele. Portanto, não podemos negligenciar a questão do background, mas devemos procurar entendê-lo. Por outro lado, não devemos ser restringidos ao background. Não podemos ensinar as pessoas a levarem ofertas ao altar, simplesmente porque o Senhor Jesus falou tal palavra. Se você for limitado pelo background, terá um grande problema. Portanto, temos de ver que não podemos negligenciar a questão do background; se o fizermos, não entenderemos o significado exato da Bíblia. Por outro lado, precisamos ser cuidadosos para não sermos presos ao background, levando-nos ao erro.
VIII. ATENTAR PARA AS DIFERENÇAS NAS DISPENSAÇÕES
As palavras de Deus para o homem são divididas em dispensações. Algumas palavras foram faladas por Deus ao homem sob a dispensação da lei. Outras palavras foram faladas por Deus ao homem sob a dispensação da graça. Quando tentamos entender essas palavras, devemos discernir as diferentes dispensações. Não devemos aplicar à dispensação da graça, as palavras faladas na dispensação da lei. Esse é o engano dos adventistas do sétimo dia, quanto à questão de guardar o sábado. Guardar o sábado é um mandamento que Deus deu ao homem na dispensação da lei. Quando chega-se à era da graça, é algo totalmente diferente. Mas os adventistas do sétimo dia apegam-se a Êxodo 20 e dizem que, uma vez que Deus falou claramente sobre o sábado, temos que guardá-lo hoje. É verdade que Deus falou sobre guardar o sábado, mas isso é algo na dispensação da lei e não na dispensação da graça. Há outro exemplo. Em Salmos nos é dito que nossos filhos na carne são bênçãos de Deus. Lembre-se, por favor, que essa é uma palavra do Antigo Testamento. No Novo Testamento, isso já não é verdade. Não se pode encontrar nenhuma passagem no Novo Testamento que diga que os filhos na carne são bênçãos. Embora eu não possa dizer que os filhos na carne sejam agora maldições, ouso afirmar que eles são responsabilidades e lições. Hoje, na dispensação da graça, a verdadeira bênção são os filhos espirituais.
No mesmo princípio, Deus prometeu ao Seu povo escolhido, no Antigo Testamento, que eles haveriam de prosperar e ampliar seu território sobre a terra. Mas no Novo Testamento, ocorre exatamente o oposto. Se você, hoje, citando palavras do Antigo Testamento, pregar para os irmãos e irmãs, dizendo: “Graças a Deus, Ele prometeu- nos que, se O temermos, Ele ampliará nosso território e todos seremos proprietários de grandes porções de terra”, isso seria totalmente errado. Há tal promessa na Bíblia; todavia, essa promessa não está sob a graça, mas sob a lei. No Novo Testamento, Deus disse que devemos desistir de nossas terras e vendê-las para dar aos pobres. Isso é exatamente o oposto ao Antigo Testamento. Embora sejam todas palavras da Bíblia, e sejam todas inspiradas por Deus, não devemos tomar as palavras da antiga dispensação e aplicá-las à atual dispensação. Os católicos e muitos protestantes erram nesse ponto. Há muitas coisas no catolicismo que vêm do judaísmo do Antigo Testamento. Até mesmo a vestimenta dos sacerdotes e seus rituais de adoração são todos emprestados dos princípios do Antigo Testamento. E claro que essas coisas são mencionadas na Bíblia, mas elas não são para a presente dispensação. Ao expor e interpretar a Bíblia, não se pode dizer: “Isso não é palavra da Bíblia? Se é, devemos guardá-la”. Não podemos falar dessa maneira. Temos de diferenciar as eras; ou seja, temos de saber claramente a que dispensação determinada palavra pertence. Se você não está em certa dispensação, então as palavras daquela dispensação nada têm a ver com você. Mais tarde, falaremos mais sobre as dispensações.
IX. LEVAR EM CONTA A DIFERENÇA DAS PESSOAS PARA QUEM A PALAVRA É DIRIGIDA
Ao expor a Bíblia, deve-se levar em conta as pessoas para quem determinada palavra é dirigida. Algumas palavras são dirigidas aos judeus, e não estão relacionadas aos gentios ou à igreja. Algumas palavras são ditas aos gentios e nada têm a ver com os judeus ou com a igreja. Algumas palavras são faladas à igreja e não têm nada a ver com os judeus ou os gentios. A Primeira Epístola aos Coríntios 10:32 diz: “Não vos torneis causa de tropeço nem para judeus, nem para gentios, nem tão pouco para a igreja de Deus”. Na Bíblia, há, pelo menos, três tipos de pessoas para quem Deus dirige Suas palavras: os judeus, os gentios e a igreja. No Antigo Testamento, a maioria das palavras foram faladas para os judeus. No Novo Testamento, há algumas palavras faladas à igrejà. Paralelamente, quer no Novo ou Antigo Testamento, há algumas palavras faladas aos gentios. Devemos diferenciá-las claramente quando as lermos e devemos descobrir para quem elas foram faladas. Temos de diferenciar as diversas pessoas a quem as palavras são dirigidas, se para os judeus, os gentios ou a igreja. Somente depois de identificar a pessoa a quem é dirigida a palavra é que podemos fazer o julgamento adequado.
Por exemplo: alguns estudiosos da Bíblia têm discutido grandemente a respeito de para quem foi escrito o livro de Mateus. Há muitos expositores que afirmam que Mateus foi escrito para os judeus e não para a igreja. Eles se referem ao background judaico das palavras em Mateus, dizendo que o Senhor Jesus se referia claramente a levar as ofertas ao altar. Para eles, isso é uma prova de que essas palavras são para os judeus. O Senhor Jesus falou claramente sobre o julgamento do sinédrio. O sinédrio era uma organização judaica. Eles também se referem ao capítulo 24 de Mateus que faz menção ao abominável da desolação estando no santo lugar. Para eles, o santo lugar pertence aos judeus, de maneira inequívoca. O Senhor também disse que quando chegar a grande tribulação, as pessoas devem orar para que sua fuga não ocorra no sábado. Será que a igreja deveria guardar o sábado? Já que as pessoas a quem essa palavra é dirigida guardam o sábado, não serão eles judeus? Esses estudiosos mostram muitos exemplos como esses para provar que o livro de Mateus é dirigido aos judeus. Se assim fosse, isso seria algo muito sério, porque todo o livro de Mateus não mais seria nossa herança.
Após termos lido cuidadosamente todo o livro de Mateus, temos de admitir que as palavras em Mateus 5 certamente têm um background judaico, mas elas não são dirigidas aos judeus; são dirigidas ao povo do reino dos céus. O povo do reino inclui não somente os salvos dentre os judeus, mas também inclui os convertidos dentre os gentios. O povo do reino é a igreja. Pelo fato de haver entre o povo do reino pessoas que anteriormente tinham estado no judaísmo, e que tinham background judaico, o Senhor Jesus tinha de usar essas coisas relacionadas àquele background, quando fez seu sermão na montanha. Há muitas discussões sobre os capítulos 24 e 25 de Mateus. Se ler cuidadosamente, você descobrirá que uma porção foi dirigida aos judeus, uma porção foi dirigida à igreja e uma porção foi dirigida aos gentios. No capítulo 24, os versículos 1 a 30 são dirigidos aos judeus, o versículo 32 até o versículo 30 do capítulo 25 é dirigido à igreja. O versículo 31 até o fim desse capítulo é dirigido aos gentios. Ao estudarmos a Bíblia, antes de tomarmos uma decisão de interpretação, temos, primeiramente, que definir a pessoa a quem a palavra é dirigida. Somente então é que podemos entender e interpretar as palavras com precisão.
X. AS PESSOAS, EVENTOS E OBJETOS DO ANTIGO TESTAMENTO QUE NÃO SÃO CLARAMENTE APRESENTADAS COMO TIPOS, NÃO DEVEM SER TRATADAS COMO TIPOS, MAS COMO ILUSTRAÇÕES
Sabemos que há muitos tipos no Antigo Testamento. Alguns deles são simplesmente pessoas individualmente, tais como Isaque, que tipificava o Senhor Jesus como o filho herdeiro, e Rebeca, que tipificava a noiva ganha por Cristo — a igreja. Alguns tipos são eventos, tais como a páscoa dos israelitas que representa a nossa salvação diante de Deus quando recebemos o Cristo imolado como nosso Salvador. Outro exemplo é o êxodo do Egito pelos filhos de Israel, que tipifica nossa saída do mundo. Há também alguns tipos que são objetos, como o cordeiro tipificando Cristo e a serpente de bronze, também tipificando Cristo. No Antigo Testamento, muitas pessoas, eventos e objetos são tipos, mas não depende de nós decidir se eles são ou não tipos. Temos de descobrir evidências claras no Novo Testamento. Se não há nenhuma menção do objeto, evento ou pessoa no Novo Testamento, não devemos supor precipitadamente que é um tipo. No máximo, podemos apenas tomar emprestado esse objeto, pessoa ou evento como ilustração e usá-lo para explicar as verdades no Novo Testamento. Dizer que algo é um tipo significa dizer que isso é muito mais que uma ilustração. Aqui, apenas apresentamos e mostramos resumidamente esses dez princípios de interpretação da Bíblia. Esses princípios evoluíram gradualmente a partir de centenas ou milhares de anos de experiência no estudo da Bíblia. Eles são como a nata do leite e o mel das abelhas e são muito preciosos. Espero que todos possamos lembrar-nos deles claramente. Tudo isso é para nossa ajuda e restrição. Espero que, de hoje em diante, todos os irmãos e irmãs apliquem esses princípios em seu estudo da Bíblia. Se os aplicarmos, encontraremos novo significado na Bíblia e teremos um entendimento melhor, mais preciso e completo.
Referência Bibliográfica:
Witness Lee. Conhecendo a Bíblia. SP: Editora Árvore da Vida. p.80